José Vieira da Cruz*
Após uma passagem de ano festiva e fraterna, desfrutada junto aos meus familiares, como penso que devem ser os momentos especiais, li, como de hábito, os jornais de nossa cidade e deparei-me com o provocativo texto de Afonso Nascimento intitulado “Razões para criar Comissão da Verdade em Sergipe”, publicado no Jornal da Cidade, neste 1º de janeiro de 2012.
Um debate que julgo, na condição de cidadão e pesquisador, necessário para discutirmos a importância da democracia e, sobretudo para aprofundar o conhecimento de acontecimentos recentes da história brasileira e as suas diferentes interpretações.
Nesse sentido, penso que a criação de comissões da verdade também nos estados não me parece um mero capricho da esquerda ou da direita, ainda que interesses de ambos os lados possam estar presentes. O ideal nesse tipo de debate é que, além dos agentes políticos interessados, a academia possa contribuir com reflexões e estudos a respeito, a exemplo da pesquisa sobre a “Tutela Militar em Sergipe”, desenvolvida pelo historiador Ibarê Dantas.
Entretanto, a contribuição da academia e de seus pesquisadores depende do acesso universal e irrestrito à documentação, sem a qual não é possível aprofundar os estudos desse passado e de suas diferentes apropriações.
A esse respeito, não faço referência apenas ao acesso sem restrições legais a documentação do Arquivo Público do Estado de Sergipe, mas a necessidade de fortalecer a compreensão de que todo documento público é de interesse da sociedade, por isso deve estar ao acesso de todo e qualquer cidadão. Dessa forma, a responsabilidade legal por possíveis usos indevidos de informações ou registros cabem a quem porventura os fizer, e não as instituições que guardam esses documentos.
Dessa forma, não importa se o arquivo está sob a guarda do 28ª BC, do Ministério Público Federal, do Arquivo Público do Estado de Sergipe ou de qualquer outra instituição pública, é imperativo que seus acervos documentais estejam à disposição dos cidadãos.
Esse talvez seja um dos legados que a instalação da Comissão da Verdade em Sergipe, juntamente com a de outros estados, pode deixar acerca da importância de uma política nacional de arquivos e do acesso universal a seus acervos.
Além desses acervos escritos, como discutido no texto de Afonso Nascimento, podem ser acrescentadas entrevistas a ser realizadas junto a cidadãos que viveram de perto as experiências políticas desse período, ou quiçá reunir as entrevistas já realizadas a respeito por diferentes pesquisadores e instituições de Sergipe, a exemplo do que foi realizado com o “Memorial da Resistência em São Paulo”.
Mas enfim, a importância da Comissão da Verdade nos estados não se resume apenas a disponibilizar a documentação já coletada e a coletar. Ela deve defender que essa disponibilização e acesso possam ocorrer de modo universal e irrestrito. Essa postura, à propósito, tem sido compartilhada por historiadores e pesquisadores em fóruns nacionais voltados a discutir esse tema. Em resumo, os trabalhos das comissões da verdade nos estados, a exemplo do que pode ocorrer com a Comissão da Verdade nacional, pode ampliar o debate sobre a importância da democracia, da cidadania e dos direitos políticos de modo mais qualificado e legítimo. Pelo menos é isso que se deseja e se espera, inclusive na boa terra de Sergipe.
* Doutor em História, prof. da SEED, da SEMED e da UNIT
Fonte: CRUZ, José Vieira da. "A criação da Comissão da Verdade nos estados: uma discussão necessária!" In: Jornal da Cidade, Aracaju, 03 de janeiro de 2012. Disponível em: http://www.primeiramao.blog.br/post.aspx?id=2919&t=a-criacao-da-comissao-da-verdade-nos-estados-uma-discussao-necessaria!
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