José Vieira da Cruz
Historiador e professor
Historiador e professor
A música, combinação entre silêncio e sons, é uma arte dinâmica e
comunicativa. A beleza e a expressividade fazem parte de suas formas, quer sejam
elas folclóricas, líricas ou clássicas. Ela é uma linguagem universal que
atravessa o particularismo dos idiomas, melhora e congraça espíritos sensíveis e
habilidosos. O amor à música, por vezes, faz homens e mulheres se reunirem em
torno de suas letras, melodias e sinfonias. E em torno deste objetivo se
articulam seus praticantes, ouvintes e admiradores. Podem ser citados como
exemplos, dessa natureza, as filarmônicas, as bandas, as liras e as orquestras.
Denominações diferentes para instituições responsáveis pelo enlace de músicos,
maestros e do público em torno da cultura, educação e profissionalismo.
Apesar de Sergipe está se notabilizando nacionalmente, especialmente nas últimas décadas, como “o país do forró”. Em razão do seu rico e diversificado campo cultural no qual os festejos juninos são expressões consagradas, também é um traço característico de suas raízes culturais ser um celeiro de instituições musicais cuja tradição é centenária. As apresentações dessas instituições em procissões, momentos comemorativos, solenidades oficiais e momentos de descontração já fazem parte constitutiva da cultura histórica estadual. O cinema nacional reconheceu e utilizou essa tradição no filme “Orquestra dos meninos”, aproveitando cenários e atores locais para contar a história de um maestro, apaixonado pela música, e que via na realização de seu sonho uma alternativa cultural e profissional para jovens do agreste nordestino. Não obstante a narrativa da produção cinematográfica ter sido inspirada em fatos reais ocorridos em outro estado, no que tange à paixão pela música, a importância e a tradição das escolas de música em Sergipe, reservadas suas particularidades, envolvem um rico mosaico de narrativas. Contá-las nestas breves linhas seria um ato insano e desmerecedor.
O grande número de bandas, filarmônicas, liras, associações e orquestras têm apontado o estado como um celeiro musical responsável pela formação de compositores, instrumentistas e maestros que atuam, tanto no cenário local como para além de suas fronteiras. Vocação musical evidenciada, em maior ou menor intensidade, desde o século do século XIX, em vários municípios. Além de Aracaju, Capital do Estado, e das bandas de instituições militares, municípios como Aquidabã com a “Filarmônica Lira Senhora Santana”, Arauá com a “Filarmônica Municipal Nossa Senhora da Conceição”, Barra dos Coqueiros com a “Filarmônica Municipal de Barra dos Coqueiros”, Boquim com a “Lira Santana”, Brejo Grande com a “Filarmônica Municipal de Brejo Grande”, Campo do Brito com a “Filarmônica Municipal Nossa Senhora de Boa Hora”, Capela com a “ Filarmônica Nossa Senhora da Purificação”, Carmopólis com a “Associação Musical Teotônio Neto”, Cristinópolis com a “Associação Musical Aprobex”, Estância com a “Sociedade Musical Lira Carlos Gomes”, Frei Paulo com a “União Lira Paulistana”, Gararu com a “ Filarmônica Eutichio Alves da Cruz”, General Maynard com a “ Filarmônica Municipal General Maynard”, Indiaroba com a “Nossa Senhora de Indiaroba”, Itabaiana com a “Filarmônica Murilo Braga” e a “Filarmônica Nossa Senhora da Conceição”, Itabaininha com a “ Filarmônica Nossa Senhora da Conceição”, Itaporanga com a “Filarmônica Municipal de Itaporanga”, Japaratuba com a “ Filarmônica Euterpe Japaratubense” e a “Sociedade Cultural Santa Terezinha”, Lagarto com a “ Lira Popular”, Laranjeiras com a “Filarmônica Municipal Coração de Jesus”, Malhador com a “Filarmônica Jacinto Figueiredo Martins”, Nossa Senhora da Glória com a “Banda de Música Nossa Senhora da Glória”, Nosso Senhora do Socorro com a “Filarmônica Municipal de Socorro”, Pirambu com a “Filarmônica Municipal de Pirambu”, Poço Verde com a “Lira Santa Cruz”, Porto da Folha com a “Banda de Música Antônio Carlos du Aracaju”, Propriá com a “Filarmônica Santo Antônio”, Riachão do Dantas com a “Filarmônica Nossa Senhora do Amparo”, Riachuelo com a “ Filarmônico Tasso Martins Bezerra”, Ribeiropólis com a “Filarmônica Municipal de Ribeiropólis” e a “ Associação Musical Pedro Paes Mendonça” , Rosário do Catete com a “Filarmônica Luiz Ferreira Gomes”, Salgado com a “Filarmônica Municipal de Salgado”, Santo Amaro com a “Filarmônica Municipal de Santo Amaro”, São Cristóvão com a “Filarmônica João Batista Prado” e a “Associação Musical Genero Plech”, Simão Dias com a “Associação Musical Lira Sant’Ana”, Tobias Barreto coma “Filarmônica Imperatriz dos Campos”, Maruim com a “Filarmônica Euterpe Maruinense”, entre outros municípios, possuem ou já possuíram algum instituição musical.
Por esta razão, a regência dos acordes deste ensaio alimenta-se de algumas pesquisas já realizadas sobre o assunto em Sergipe. Na carona desses trabalhos, a primeira nota, o dó, é dada por Acácia da Silva que em seu estudo sobre o “Museu da Música de Itabaiana” destaca a importância da “Filarmônica Nossa Senhora da Conceição”. Instituição musical considerada uma das mais antigas em funcionamento no país, e reconhecida, também, como instituição de utilidade pública nacional por resgardar uma parte da música brasileira a partir do seu acervo e da trajetória dos seus componentes.
Neide Santana da Silva nos brinda com uma segunda nota, o ré, ao resgatar no passado da cidade de Laranjeiras, entre o final do século XIX e o desenrolar do século XX, a existência de pelos menos cinco bandas de música: A Santa Cruz, a União dos Artistas, a do Comércio, Nossa Senhora da Conceição e a do Sagrado Coração de Jesus. Silva em seu trabalho sobre as “Memórias Musicais: a trajetória da Filarmônica Municipal Coração de Jesus” revela a importância cultural e social desta filarmônica para a formação cultural e educacional de jovens talentos locais. Não destoando desta melodia, Himpácia Gonçalves Costa Bezerra em seu estudo sobre a “Filarmônica Tasso Martins Bezerra”, em Riachuelo, ao discutir a contribuição dessa instituição enquanto agência de fomentação cultural, educacional e profissional, faz soar a terceira nota, o mi.
Uma quarta nota, o fá, escreve-se semanalmente, aos domingos, no programa “Hoje é dia de retrata” apresentado pelo jornalista Jairo Alves de Almeida. Sua preocupação e sensibilidade para com o resgate e divulgação das escolas musicais dos municípios sergipanos traçam um panorama das bandas, filarmônicas, liras, associações e orquestras em atuação. Destaca os talentos musicais e, sobretudo, estimula a valorização dessa tradição em Sergipe.
Nos trabalhos em apreço verifica-se o esforço, a dedicação e desafios daqueles que se aventuram pelas veredas musicais em terras sergipanas. Esforço ora reconhecido pelos órgãos públicos e empresas privadas, ora subsumidos pela política e o jogo de interesses pessoais. Mas, para além de transitórios obstáculos, a produção musical destas instituições é nas palavras do maestro, propriaense radicado no Rio de Janeiro, Antônio Guimarães, uma brisa que passa como uma ondulação do ar com fragmentos divinos. Suas palavras captam em grande medida o significado que essas escolas representam. Para ele “sem música a vida será um erro sem alegria”.
Optando por resgatar essa alegria, mas não desejando cometer omissões e erros. Neste ensaio, tocamos algumas notas desta melodia, esperando provocar, quiçá, iniciativas outras para alargar o conhecimento das experiências do rico passado musical em apreço. Passado cujos dilemas no presente e expectativas em torno do futuro, destas escolas musicais e de sua importância para a educação e cultura em Sergipe, devem ser repensados. Pois não basta considerar as notas musicais isoladamente, é preciso considerar, também, o jogo infinito de arranjos que as narrativas sobre elas podem proporcionar para o conhecimento histórico e cultural do Brasil a partir de Sergipe.
FONTE:CRUZ, José Vieira da. "Sergipe, um celeito de escolas
musicais". In: Jornal da Cidade. 14/03/2010.
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